sábado, setembro 25, 2004
 [01.077/2004]
Do autismo político
Não é necessário recorrer à velha sentença de Lord Acton, do poder e da sua tendência de corromper. Mas, a máxima da corrupção bem pode ser substituída pela do autismo.
Em meados da década de 90 o PPD ficou embriagado com tantos anos de poder, que o PS conseguiu uma vitória, em 1995, como não imaginava então atingir.
Depois, o PS, a partir de 2000, ficou inebriado com o poder e num autismo de quem consome poder sem arejar pensamentos e posições, numa tentativa de refrescar o partido, tentativa frustrada como o tempo comprovou, realizou um congresso no final da Primavera de 2001. Em Dezembro, os cidadãos prenunciaram-se nas urnas e o Primeiro-Ministro de então, num gesto da mais elevada dignidade (no meu entender, outros com pensamento mais lapista assim não o entendem por isso afirmam que Guterres fugiu) colocou o seu lugar à disposição.
O PPD tinha, praticamente, o caminho do poder escancarado. Não foi tão fácil como se depreenderia inicialmente, pois o PS não estava tão em baixo como se calculava estar.
Agora, é o PPD que está no poder. Formando uma coligação que causa a muitos dos militantes do partido fundado por Francisco Sá Carneiro um dissabor, por não se esquecerem de quem foi o principal coveiro das maiorias de Cavaco Silva.
A recente saída do Presidente do PPD e Primeiro-Ministro, para um dos cargos mais relevantes da actualidade (sim, também neste caso afirmo: Durão Barroso não fugiu), levou o partido a nomear novo Presidente e, quase por inerência, regras tácitas da democracia!, a nomear novo Primeiro-Ministro, pois o Presidente de todos os portugueses assim o permitiu.
O PS realiza um congresso, não só por inevitabilidade de calendário da vida interna, mas também por imperativos de liderança.
O PPD, não querendo ficar atrás do principal adversário político, agenda um congresso, numa nítida tentativa de marcar o PS e com um conclave, a decorrer em Novembro próximo, mostrar que o PPD está unido em torno de um projecto.
Ora, quanto a mim, irá acontecer ao PPD, a partir de Novembro, o que aconteceu ao PS em 2001. O congresso laranja transmitirá o amorfismo em que o partido se encontra, por não haver nenhuma disputa de liderança. Apenas a consagração do líder pela simples consagração. Depois, será o descambar eleitoral do partido. De derrota em derrota.
O PPD perderá as eleições autárquicas de 2005. Como o PS perdeu as de 2001. Não tanto pelo trabalho feito (ou não) pelos seus autarcas, mas pela reprovação da sua política. E, em 2006, perderá as legislativas.
A política portuguesa está a tornar-se óbvia de mais. Fica-se com uma sensação que só há vias para o país na oposição, mesmo que esta não a tenha. Mas, à falta de melhor, muda-se, como aconteceu em 2002.
O ritmo democrático português precisa de um outro e forte impulso.
Espero que a luta eleitoral socialista tenha mais efeito em Portugal. Muito para lá do impacto que teve na vida interna de um partido político.
Portugal merece partidos fortes, sobretudo um PS e um PPD forte. Com projectos de mudança efectivos e não alternâncias, de ora entra um ora sai outro. Alternâncias que nos têm conduzido, nos últimos anos, a uma descrença generalizada nos partidos e nos políticos e que tende recrudescer.
O PS contribuiu, com este debate interno, na parte que lhe competia, para a elevação do debate e confronto político. Pelo menos até agora. Espera-se que esta mudança se torne efectiva, pois a democracia portuguesa bem precisa de um novo dinamismo. Mas, a partir de agora os desafios e as responsabilidades do PS, por causa do debate que conseguiu promover, são acrescidos. Devem os socialistas, por isso, saber elevar ainda mais o debate. Deseja-se, naturalmente, que todos os partidos portugueses o queiram fazer.
O autismo político está sempre perto. Quando não está mesmo presente. Assim que o partido vencedor se senta na cadeira do poder, a probabilidade de contrair tal patologia é elevada. Os últimos anos têm demonstrado este greve sintoma.
CMC
9:47:00 da tarde
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