domingo, novembro 21, 2004
[1.370/2004]
As bombas-relógio da Europa
Nos últimos anos a Europa tem sentido, cada vez com mais premência, os efeitos das bombas-relógios que gerou sem se preocupar. Elas estão espalhadas por todas as principais cidades europeias.
O que são estas bombas-relógios? São os bairros guetizados de imigrantes, que assumem uma atitude hermética, tal como a comunidade que as acolhe se fecha e faz dessas pessoas os outros a evitar. Mas, todos, ou quase todos, se esquecem que habitamos no mesmo espaço territorial.
De facto, o preconceito nacional na Europa sempre foi, consciente ou inconscientemente, vincado. O fenómeno do terrorismo de índole islâmica apenas ajudou a evidenciar ainda mais essa fronteira. Não tanto no nosso país, pela pouca expressividade de uma comunidade islâmica como têm outros Estados europeus.
O assassinato de Theo Van Gogh, na liberal Holanda, que há três anos foi palco de outro acto abjecto, com o homícidio do líder da extrema-direita, que actualmente é considerado o herói nacional neerlandês, à frente de outras personalidades marcantes de todos os tempos, como Erasmo, é sinal de um acentuado regresso ao nacionalismo vigente na primeira metade do século XX no Velho Continente.
A intolerância começa a apoderar-se das pessoas, pois tudo o que não é autóctone é alvo de desprezo e repulsa. E, não se culpem os líderes da extrema-direita europeia, como o senhor francês ou o senhor austríaco, que até já conseguiu colocar o seu partido no Governo. Afinal, eles apenas fazem o seu trabalho político: alimentam-se do descontentamento das pessoas e com um discurso que vai ao encontro da emoção, e não da razão, vêem as suas percentagens eleitorais crescer.
E, os partidos de poder, à direita e à esquerda, continuam a fazer de conta que não existem problemas sociais graves e que as bombas-relógio podem explodir a qualquer momento.
Primeiro, a UE teve a lamentável atitude de boicotar a Áustria, em 2000, quando o FPÖ, da extrema-direita, integrou o Governo em coligação com os conservadores. Agora, na Bélgica, ilegaliza-se um partido, também de extrema-direita, em ascensão surpreendente.
Esperam, os iluminados (pseudo) democratas, que com estas atitudes o sentimento de apoio a estes partidos diminua? Obviamente que não. Pelo contrário. O descontentamento político de muitos cidadãos, sobretudo o anémico, para quem a política é algo de indiferente, acaba por encontrar nestes agrupamentos políticos outras vítimas da política reinante.
São cidadãos, os que não participam politicamente, os mais e menos informados, que não se identificam com o tipo de políticas vigentes e encontram nestes movimentos, dos extremos, um motivo para aderir a uma causa, que não têm, e, que, deduzem, a priori, este tipo de partidos vem romper com a situação política de alternância instalada.
Em suma, as bombas-relógio acabam por ser os dois lados da barricada, os pertencentes endógenos e exógenos, que, ao fim e ao cabo, não deixam de ser uma só agremiação, pois ambos pertencem ao mesmo espaço territorial.
Outro acto bem recente e lamentável ocorreu na passada semana, quando a selecção inglesa se deslocou a Espanha para jogar com a sua congénere e os jogadores negros ingleses foram apupados, ao longo de todo o jogo, por alguns milhares de adeptos espanhóis.
A Europa tem centenas de bombas-relógio espalhados por todos os pontos e Portugal não escapa a esta dramática realidade. O caso da área metropolitana de Lisboa é disso exemplo. Desde o concelho de Setúbal ao concelho de Mafra, é uma área cheia de bombas-relógio.
Já é tempo de nos preocuparmos mais e prevenirmos as ebulições das bombas-relógio, sob pena de, num momento quente a nível mundial como o presente, entrarmos num extremismo suicidário para todos.
Importa, no caso europeu, não olvidar, sobretudo os mais cépticos, da necessidade dos emigrantes no Velho Continente. As portas não podem estar escancaradas, mas também não podemos viver num espaço fortaleza.
A situação é difícil. Contudo é preferível enfrentá-la a esquecê-la, pois, por mais que queiramos tapar o Sol com a peneira as bombas-relógio estão aí e o seu rastilho é demasiado curto.
CMC
3:04:00 da manhã
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