[0.202/2005]
O apoio de Freitas do Amaral ao PS

Considero que o apoio manifestado por Diogo Freitas do Amaral não é nada surpreendente.
Para além do simbolismo político que representa, goste-se ou não do senhor ele é um dos fundadores do CDS e um dos considerados "pai" da democracia portuguesa.
O apoio manifestado pelo texto publicado na Visão, quanto a mim, não aquece nem arrefece os resultados do PS.
Freitas do Amaral não vai afastar nem trazer novos eleitores. O "peso político" do antigo dirigente democrata-cristão junto do eleitorado não é o de outros tempos.
Pode, contudo, uma ou outra pessoa, simpatizante do reputado académico, deixar-se levar pelo apelo, assim como alguém que tem pouca afinidade com Freitas não votar PS.
Na realidade, os democratas-cristãos portugueses que hoje votam PS, votam mais pelo que o PS ainda tem de guterrista, a marca Guterres é indelével neste eleitorado democrata-cristão, como pelo facto de o PS apresentar alguns candidatos da área da democracia-cristã ou próxima dela. Desde o independente, mas digno no trabalho, dedicação e extrema qualidade Humana e Política de
Guilherme d'Oliveira Martins, aos membros do Movimento Humanista:
Maria do Rosário Carneiro e
Teresa Venda. A quem, neste momento, se junta o candidato número um do PS pelo Porto,
Braga da Cruz.
Freitas do Amaral é mais um dos nomes, da "velha guarda" da democracia-cristã, que nada tem em comum com a actual propalada democracia-cristã do CDS. Que de doutrina democrata-cristã tem muito pouco.
As pessoas do CDS e do PPD mostraram indignação. Ora, neste caso, nada de mais errado.
Quem conhece
Diogo Freitas do Amaral, e no CDS ainda há quem conheça o seu fundador, a posição do ex-Presidente da Assembleia Geral das Nações Unidas não é em nada incompatível com a sua posição política desde 1974.
Para quem se esquece, nomeadamente à direita, Freitas do Amaral sempre se assumiu como político do centro. Para mim, tal enquadramento não coincide propriamente com a postura sempre defendida por Freitas, pois não consigo encontrar definição para o espectro político do centro. Sempre considerei Freitas do Amaral um homem de direita, moderada, democrata-cristão e progressista.
Mas, pegando na posição desde 1974 de Freitas do Amaral, este sempre disse ser e situar-se ao centro. Para quem tem dúvidas basta ler a sua biografia política e constatar que, desde a implantação da democracia em Portugal, a sua posição tem sido esta. E o livro não foi escrito ontem, nem em 2002, para poder apoiar Durão Barroso.
Há quem, à direita, veja uma traição. O que é incorrecto. O próprio Freitas do Amaral nos últimos anos tem explicitado qual é a sua posição. Em Portugal, no que diz respeito à política interna, Freitas revê-se mais no PPD. Em política externa, no PS.
Freitas do Amaral não se revê, assim como muitos militantes do PPD, só não o afirmam publicamente por uma questão de pudor militante, que esta liderança, a maioria destes líderes do PPD, não têm qualidade.
Por isso, o apoio dado em 2002 ao PPD, não causou qualquer pasmo para ninguém, e, agora, a retirada desse apoio para dá-lo ao PS também não.
Restam-me poucas dúvidas, caso a liderança do PPD hoje fosse outra, e Freitas do Amaral apelaria, de novo, ao voto no partido fundado por
Francisco Sá Carneiro.
O problema, para Freitas, como para muitos militantes e simpatizantes do PPD, reside nos actuais responsáveis políticos do partido. Falta-lhes, como se comprovou nos últimos meses, qualidade política, responsabilidade cívica e sentido de Estado.
Quanto ao CDS, e à actual liderança, e à incompatibilidade das pessoas, o problema é outro. E este encontra-se, ou melhor, provem desde 1992, com a nova liderança do partido. Na altura encimada pelo actual líder da Nova Democracia em parelha com o actual líder do CDS.
A liderança do CDS, desde 1992, representou para Freitas do Amaral a machadada final nos valores do partido que fundara em 1974 com
Adelino Amaro da Costa.
Aliás, não é por acaso que desde esse período os valores democrata-cristãos foram arredados da doutrina política do partido. Substituídos por uma posição populista, anti-europeísta, ao arrepio do que foi um dos grandes pilares e valores do CDS de 1974: o aprofundamento da Europa política.
O CDS transformara-se em tudo aquilo que Freitas não apreciava no partido que fundou. O partido deixara de ser um partido de quadros, para se tornar um partido populista. Ou seja, o partido que Freitas sempre quis, uma versão portuguesa da francesa UDF, tinha desaparecido.
Ainda foram ensaiados alguns pontos de encontro entre Freitas e a nova direcção do CDS, mas tais pontos de convergência goraram-se, por que os valores, de ambos os lados, colidiam.
Em suma, penso que o apoio manifestado por Freitas do Amaral ao PS não surpreende ninguém. Só mesmo o simbolismo da manifestação pública é que provocou a mini-celeuma.
Afinal, sempre se trata de um fundador de um partido que concorre às eleições e manifesta o apoio a quem já foi o principal adversário noutros tempos (aqui sim, uma diferença notória em relação ao apoio que Freitas já dera ao PPD, que nunca foi o adversário, no campo das posições políticas, do CDS).
CMC